Campus da University of Copenhagen

Como foi minha experiência estudando Economia em Copenhagen

Voltei tão acelerada da viagem que ainda não tinha conseguido tirar um momento pra escrever este texto. Já era hora.

Tl;dr: foi uma experiência incrível.

Vou tentar sumarizar os principais pontos em relação ao curso em si, embora a experiência e os aprendizados resultem de uma soma de fatores que vão muito além do conteúdo programático.

Por que fui estudar economia?

Passei o mês de agosto estudando Behavioral and Experimental Economics na University of Copenhagen, um curso de verão voltado a estudantes de mestrado e PhD em economia (o que não sou).

Decidi ir mesmo sem ter estudado economia (na verdade estudei um pouco por conta própria). Eu já sabia que o curso seria mais difícil pra mim do que para a média dos estudantes. Hoje, olhando em retrospecto, fico feliz por ter assumido o risco, tomado coragem e feito isso. Consegui lidar relativamente bem com os gaps — à custa de muitas horas extras de estudo, claro.

Papers e notebook: estudando economia
Bota hora extra nisso!

Mas por que estudar economia?

Minha aproximação com o campo das ciências comportamentais começou pela psicologia aplicada e neurociência. Mas acontece que o estudo das consequências agregadas do julgamento e tomada de decisões está no cerne outra disciplina igualmente importante, a economia. Tão importante, que o nome economia comportamental é até mais conhecido que o nome ciências comportamentais, embora a primeira esteja contida dentro da última. Motivo mais que suficiente pra me juntar aos colegas economistas, concordam?

O programa do curso

Uma das coisas que mais bacanas é que, além de economia comportamental, eu tive também uma introdução à economia experimental.

Colocando de uma forma bem, bem ampla, o programa do curso estava dividido em três partes:

  • Introdução. Os conceitos fundamentais de economia comportamental e experimental. Estudamos o que chamam de “as três ondas” da economia comportamental, as conturbada interação com os modelos tradicionais da economia e os prós e contras do método experimental na investigação dos fenômenos comportamentais.

  • A segunda onda da economia comportamental. Embora para o público leigo a primeira onda (inaugurada pelas descobertas de Kahneman e Tversky nos anos 1970/1980) e a terceira onda (que podemos resumir na ideia de nudging) sejam mais conhecidas, o foco do curso foi a segunda onda da economia comportamental. Com bastante profundidade, revisamos muitos papers de economistas investigando experimentalmente as anomalias comportamentais em relação às previsões da teoria econômica. Entram aí as investigações em aversão a perdas, disparidades entre willingness to pay e willingness to accept, vieses no julgamento de probabilidades, distorções no comportamento de oferta e demanda em mercados diversos, complementaridade estratégica, coordenação e expectativas, e money illusion.

  • O impacto agregado das decisões coletivas na sociedade. Essa parte do programa foi muito interessante por propor uma visão menos contextual, mais agregada, do impacto dos vieses e erros sistemáticos em tomada de decisão. Foram temas como preferência social por justiça, honestidade e confiança, e uma discussão super rica sobre discriminação, cooperação social e democracia (votações, que são talvez o exemplo mais ilustrativo de decisões coletivas de alto impacto). Em especial nessa parte do curso, estudamos um corpo maior e muito interessante de evidências científicas em pesquisa de campo complementando os experimentos de laboratório.

O rigor científico e acadêmico no estudo e análise de cada tema foi um grande diferencial pra minha experiência. Como não tenho um background acadêmico, esse rigor cumpriu um papel importante de colocar high standards no que compreendo como evidência e validação dentro das ciências comportamentais aplicadas.

O nível de objetividade, seriedade e comprometimento da turma, e o alto nível das discussões em sala também foram bem diferentes de qualquer experiência anterior de estudos que já tive. Como tenho dito aos amigos mais próximos, minhas definições de objetividade, seriedade, disciplina, produtividade e foco foram atualizadas com sucesso depois desse summer course.

Os experimentos no laboratório

Ao todo, conduzimos cinco experimentos no Laboratory of Experimental Economics (LEE) da University of Copenhagen, em reproduções de estudos clássicos.

O primeiro envolvia julgamentos em situações de tomada de decisão intertemporal, social e sob incerteza; dois envolviam simulação de mercados; e os dois últimos tratavam de justiça, cooperação e punição social, com uma reprodução elaborada de public goods games em diversos tratamentos.

Cada dia no laboratório resultava em um assignment (um trabalho) onde nossa missão era analisar os dados gerados pelos experimentos para compreender e interpretar o comportamento dos participantes. Mas antes disso, era importante estabelecer os predictions — qual seria o comportamento esperado, ou previsto, pela teoria econômica? Para isso utilizávamos métodos de microeconomia (qual o valor de equlíbrio? como é a eficiência desse mercado?) e teoria dos jogos (qual é o Nash Equilibrium?).

Claro, os resultados obtidos pelos experimentos sempre desviavam em relação ao esperado e a explicação desses deviations inevitavelmente passa pelo que é o grande objeto de estudo da economia comportamental: a limitação da racionalidade humana e o papel das instituições (como mercados, sociedade) na modulação do nosso comportamento, digamos, não otimizado.

Papers, referências e a prova final

A bibliografia completa do curso envolve mais de 100 papers. De leitura obrigatória, foram quase 50 (pra quem tiver curiosidade, deixei aberta minha pasta no Drive com a maior parte deles).

Tivemos uma prova final com 24 questões divididas em seis temas diferentes. Fiquei super feliz de ter conseguido resolver 23 delas, e estou ansiosa pra saber como fui (as notas — que lá na University of Copenhagen são sete inteiros numa escala de -3 a 12 — ainda não saíram). Mas muito mais importante que isso, é tudo que aprendi, e que sem sombra de dúvida vai muito além do que trouxe nesse texto hoje!

Valeu muito a pena ter tido essa experiência, que me ajudou a superar algumas barreiras e a me sentir ainda mais preparada para os próximos passos na minha transição de carreira para as em ciências comportamentais.

5 comentários sobre “Como foi minha experiência estudando Economia em Copenhagen

  1. […] Quando estudei Behavioral and Experimental Economics em Copenhagen, um dos temas do curso era cooperação e tomada de decisão relacionada a bens públicos. Lá, estudei algumas pesquisas experimentais que, por sua consistência de resultado, acabaram dando corpo ao que se chamou de teoria das janelas quebradas, ou broken windows theory. A ideia geral é que lugares degradados e mal cuidados tendem a exibir maior índice de criminalidade e violência do que lugares bem cuidados. […]

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